Muitas vezes basta ser:
Colo que acolhe,
Braço que envolve,
Palavra que conforta,
Silêncio que respeita,
Alegria que contagia,
Lágrima que corre,
Olhar que acaricia,
Desejo que sacia,
Amor que promove.
(cora coralina)Segui à risca o teu conselho:
- Fica aí, impassível, economiza tua saudade.
Tentei me mexer o mínimo possível, de modo que tivesse tudo de importante por perto. Na minha rua tinha a fruteira, a locadora e a farmácia. Igreja não. Saía de casa umas duas vezes no dia, uma bem cedo, no horário onde cantavam os longínquos galos que só eu imaginava. e outra mais tarde, quando a lua interceptava a vista do sol, momento do paradoxo temor em que se podia enxergar o seu reflexo de astro-maior sem ter que encará-lo - olhos flamejantes.
Com o tempo que não cabe nessas linhas, me acometeu uma grande saudade da saudade. Afinal, na minha casa tinha cama banheiro cozinha. Na cozinha geladeira, no pátio a luz do sol seguia refletindo mesmo madrugada adentro. Tudo direitinho. Uma árvore tataracentenária, canários canadenses que há muito não voavam para o norte;
(Embora se notasse uma saudade opaca no seu olhar canoro.)
E eu pensando.
Passei os anos fugindo dessa saudade estampada na minha própria sombra. E hoje tudo o que sinto é.
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Segui à risca o teu conselho:
- Fica aí, impassível, economiza tua saudade.
Até ver que a saudade é palavra que não existe em nenhuma língua - nem em português! - pretensa palavrinha de se explicar a dor e o amor com o mesmo gesto, bandeira marrom tremulando como nada dissesse.
Hoje sou saudade e semeio saudade. Impassível às vezes, impassível na saudade.
A árvore hoje é um condomínio, não mais de pássaros, mais de homens que passam, de rios de calamidades humanas. Os canários não mais os vi. Será que acharam outra daquelas figueiras tricentenárias? Fruteira, a locadora, a farmácia, nada. Grandes buracos com água escura no fundo. Os galos pararam de cantar, e eu parei então de imaginá-los. Na minha casa já não tinha mais cama, nem banheiro nem cozinha. Não havia casa. A luz do sol que visitava minhas madrugadas agora se escondia marota nos postes de esforçadas luzes elétricas. Minha sombra saiu andando, curva, na sua doentia exigência de uma democracia que não se esperava de um mero espelho monocromático.
Enfim, segui à risca o teu conselho, mas agora quem dá as cartas sou eu, conselheiro de mim mesmo! No xadrez, xeque-mate!
colo
braço
palavra
silêncio
lágrima
olhar
desejo
amor:
e eu, impassível!